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VAN HELSING: QUANDO UMA BOA IDEIA NÃO BASTA.

Por Bárbara Sobral •
quinta-feira, 9 de junho de 2022

 



Vou começar desabando as suas expectativas: Van Helsing não é uma série boa, muito menos ela foi produzida em um canal bom - no caso, o canal estadunidense SyFy, mas retorno quanto a isso mais a frente. E dificilmente ela estaria na minha lista de cinco séries sobrenaturais que eu recomendaria para alguém assistir. 

No entanto, bem ou mal explorados, ela tem elementos interessantes  que vem na minha mente vez ou outra quando o assunto "séries sobrenaturais" surge na rodinha. Aliás, inicialmente planejei esse texto assim que terminei de maratonar a série e eu precisava desabafar sobre a experiência, mas acabou que esse texto também serve como uma dica para escritores sobre coragem narrativa e o que deve ser evitado na construção de uma história e personagens em uma narrativa longa. 

Van Helsing (2016-2021) narra a história de Vanessa Van Helsing, filha de ninguém mais, ninguém menos Abraham Van Helsing, o famoso caçador de Vampiros, que passou os últimos cinco anos em sono profundo e acorda em um mundo devastado pelos vampiros, que tomaram conta do mundo. Com ajuda de Axel e uma galerinha cheia de problemas, e também dos seus recém descobertos poderes, Vanessa pode ser a arma para acabar com os vampiros de uma vez por toda. 



Ao longo de 5 temporadas, a série passeia por personagens carismáticos, como Axel e Julius, vilões um tanto caricatos, como Sam, mas que funcionam na ambientação da história, uma distopia sobrenatural com os humanos tentando não ser devorado por vampiros em um mundo de cidades destruídas, submundos, seitas e muitos passeios nas florestas. 

Os vampiros tem elementos conhecidos pelo público: as presas, os hábitos alimentares e habilidades especiais, como a força. No entanto, a série brinca com as possibilidades por trás dessas criaturas, desenvolvendo pouco a pouco uma mitologia própria em que temos vampiros com comportamento animalesco, bruxas vampiros, oráculos e até vampiros que não são vampiros e voltam a ser humanos e depois vampiros. 


Com o uso recorrente de maquiagem, pasta d'água e muita groselha como sangue, uma galera reclamava da qualidade do trabalho de maquiagem e efeitos especiais, no entanto, eu curtia o modo que essas diferenças narradas e abordadas na história, e no final da história, o efeito especial é só uma parte para a imersão na história, e não é a fundamental. 

A SyFy não é conhecida por ter as melhores séries, as suas produções costumam ser bem fracas possuindo roteiros furados e (d)efeitos especiais de causar dor. Eu, por outro lado, encontro na SyFy um refúgio de boas ideias que muitas das vezes são mal aplicadas ao longo das suas temporadas ou tem pouco investimento financeiro. Dois sucessos supremos do canal seriam Wynonna Earp e Z Nation, que como qualquer outra série tem seus problemas, mas conseguem manter uma linearidade, cumprir com a sua proposta, corresponder com as expectativas do público e deixar uma marca afetiva.

PODE TER ALGUNS SPOILERS DAS TEMPORADAS.

Infelizmente isso não aconteceu com Van Helsing. A primeira e segunda temporada é bem instável, conseguindo ter dentro de uma temporada altos e baixos, o que afeta na construção de personagens e dos relacionamentos, até então legais e interessantes, que acabam tomando atitudes estúpidas só para o enredo acontecer como os roteiristas necessitam. É uma série que tem representatividade, mas que não sabe explorar relacionamentos, o que cria um problemão, como quando eles "esquecem" que Vanessa namorou uma mulher e um homem, cem um espaço curto de tempo e ela não comenta sobre seus sentimentos por nenhum deles, e quando o roteiro quer, traz um deles de volta na vida dela como o grande amor da vida dela e esquece disso, quando é do interesse deles. Continuidade não é um ponto alto nessa série. 

Scarlett em cena de "Van Helsing".


Após a chegada de Scarlett, Jack e Violet, os enredos ganharam uma renovação. Além das atrizes encaixarem muito bem com o resto do elenco, as personagens trouxeram a tona novas camadas nos outros personagens e introduziram temáticas diferentes e interessantes, como no caso de Scarlett, que divide com a Vanessa o fardo de ser a resposta para o fim dos vampiros e começa uma relação amorosa com um dos protagonista. 

Van Helsing tem dois pontos altos: a trama envolvendo a clonagem dos genes do Abraham e a Condessa Dracula. 



A trama da clonagem tem um Q de batido, eu sei, mas ela nos possibilita episódios interessantes que nos levam ao passado da Vanessa e Scarlett, a gente tem um episódio de viagem no tempo - coisa, que honestamente, eu não via rolando aqui e certamente, tá na lista de melhores episódios da série - e também trás um lado político para o universo, mostrando que o quê restou de governo buscou manter o controle e o poder em suas mãos, e usufruir tal poder para os seus interesses que não culminavam para a segurança e sobrevivência da Vanessa, Scarlett, Jack e Violet. 

Condessa Dracula. Essa foi uma jogada perigosa. Dracula é conhecido por ser um homem sedutor, charmoso e cheio de esposas. Normalmente, interpretado no cinema por um ator bonitão que leva uma legião de fãs para os cinemas para vê-lo abocanhando os pescocinhos da galera - e desejando em silêncio que ele abocanhasse o seu pescoço. Oi, Gerard Butler. Os roteiristas tiveram coragem e inteligência ao transformar esse personagem absurdamente conhecido e amado por ser x e transformá-lo em uma mulher com traços semelhantes ao personagem literário com noivas perigosas e encorpou a sua história com uma nova camada e persona, ganhando o público. Eu queria tanto ver uma Dracula mulher e nunca pensei que seria Van Helsing que seria capaz de realizar o meu desejo. 

Jack, Vanessa, Violet e Axel em cena de Van Helsing.


Infelizmente, não realiza com perfeição. Tricia Helfer é muito competente no papel, tanto na sua versão contemporânea e especialmente na sua versão do passado. O problema está no roteiro que pouco aproveitou Dracula como vilã. Ela é apresentada como alguém violento e perigoso. Eu conto em uma mão a quantidades de vezes que ela apareceu para plantar o terror e não foram na sua maioria das vezes uma presença que culminaram em temor e apreensão pelos personagens. O que funcionava na Dracula era a atriz compreender quem era essa personagem, as suas motivações e desejos, mas o roteiro não compreendia que tinha pouco tempo para nos vender essa personagem. Os roteiristas tiveram uma surpresa com a ausência da Kelly Overton (a Vanessa) que se afastou da maioria dos episódios da última temporada e voltou para os últimos episódios só para matar a Dracula. O poder da vilã não é explorado, a gente não vê a relação dela com as noivas, nem com a Vanessa, a gente não vê ela vivendo nesse espaço "moderno" e contemporâneo, a gente pouco entende de onde ela veio... E infelizmente, é essa a questão com Van Helsing: é uma série com um montão de ideias boas, mas que na prática, elas são atiradas no nosso colo, como se nos dissessem: é assim, aceite.

Só que nem sempre é fácil para a gente abaixar o véu da crença.  

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